Quando
reflito sobre o nosso sistema fiscal renasce de imediato na minha memória uma
frase célebre da famosa personagem de banda desenhada de Astérix e Obélix: “estes
Romanos são loucos”. Embora, neste caso, os Romanos somos nós!
Atualmente
acredito que o nosso sistema fiscal tem apenas um objetivo: obter receitas,
mesmo que de forma atabalhoada, com a preocupação de passar para a sociedade a
ideia de que se está a praticar justiça fiscal ou qualquer outra coisa
benevolente. Embora não seja este o propósito deste artigo não resisto a
indicar alguns exemplos: o IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis), o AIMI
(Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis), as elevadas coimas por
incumprimento de prazos, as tributações autónomas (tributação sobre o consumo) previstas
num código sobre o rendimento, ou ainda o aumento da tributação das bebidas
açucaradas.
A mais recente prova disto é a recente notícia no Diário de Notícias [13/07/2020] que passo a transcrever
um extrato:
No biénio 2015/2016 estavam enquadrados naquela categoria (categoria
B – IRS) 90 mil contribuintes, sendo que 90% tinha aderido por opção à
contabilidade organizada. Mas enquanto os que estão no regime simplificado
tiveram neste período uma rentabilidade fiscal média de 22,7%, os que estão na
contabilidade organizada apresentaram uma rentabilidade fiscal entre 6,5% e 8%.
Diferença que, segundo a IGF, “representa uma perda potencial
para o erário público de 1.250 milhões de euros/ano de rendimento tributável”.
Esta situação levou a IGF a propor ao Governo limitações no acesso
ao regime da contabilidade organizada além do valor da faturação anual (200 mil
euros).
Agora fica claro que o Regime simplificado, na verdade, nunca teve como
propósito ser de aplicação simples. O propósito do mesmo é simplificar ao
Estado a obtenção de receita fiscal, mesmo que de uma forma atabalhoada e com
toda a complexidade que envolve para o contribuinte.
Ora, chegámos ao cerne da questão deste artigo: a complexidade do sistema
fiscal português e os custos que dele derivam para a nossa economia.
A complexidade carateriza-se por três fatores: quantidade de obrigações
fiscais, complexidade na interpretação da Lei e ritmo de mudança
legislativa.
No que diz respeito à quantidade de obrigações fiscais, vejam a
agenda fiscal disponibilizada pela AT relativa às obrigações declarativas e de
pagamento no site da AT. Os Contabilistas Certificados são
conhecedores do peso destas obrigações ao ponto de terem reivindicado um
período de férias fiscais à semelhança das férias judiciais que se praticam no
nosso país.
Vejamos a complexidade na interpretação da Lei. Esta complexidade
vai desde a sua extensão à própria compreensão.
Frequentemente deparamos com especialistas em fiscalidade com diferentes
opiniões e nalguns casos com dúvidas na interpretação de diversa legislação. Por
outro lado, também a Autoridade Tributária, através dos seus técnicos
especializados no serviço de atendimento, apresenta, por vezes, diferentes
respostas para a mesma questão. E, com exceção das informações vinculativas, as
respostas, mesmo por escrito, através do e-balcão não vinculam a Autoridade
Tributária. Por algum motivo será!
Para tornar isto ainda mais complexo junte-se a este “cocktail” um ritmo
de mudança tremendo. Basta seguir nas redes sociais os grupos de
profissionais de contabilidade para aferir a dimensão do problema. Por vezes,
até há dúvidas relacionadas com as datas para cumprimento das obrigações
fiscais.
A este propósito, muito recentemente, a posição da Ordem dos Contabilistas Certificados sobre o
prazo de entrega da declaração de IRS sem coima era diferente da Autoridade
Tributária. Isto é de bradar aos céus.
Portanto, é evidente que o nosso sistema fiscal é um emaranhado de artigos
repartidos por vários diplomas legais de elevado custo para a
nossa economia.
Por este motivo encontramos vários empresários que não valorizam o trabalho do profissional de contabilidade, porque na verdade não lhes cria valor. Também não é de estranhar que da parte dos contabilistas haja uma certa perplexidade quando alguns empresários consideram o preço dos seus serviços elevados, face ao fastidioso trabalho e responsabilidade que acarretam.
Face ao exposto, podemos concluir que o custo deste sistema fiscal complexo
é suportado pelos empresários quando os contabilistas praticam um preço justo. Quando
os contabilistas certificados praticam um preço abaixo do justo valor, o custo
do sistema fiscal é suportado por ambos, empresário e contabilista certificado.
Urge, portanto, simplificar reduzindo o custo do sistema fiscal e
valorizando o sistema contabilístico porque, este último, é uma fonte de
criação de valor.
Artigo de opinião de Nuno Duarte Pereira